
O jato particular pousou na pista do Aeroporto Afonso Pena, em Curitiba, como um sussurro — um fantasma elegante cortando a névoa fria da manhã. Sebastião Reis saiu, sua expressão indecifrável por trás dos óculos escuros de grife. Aos quarenta e cinco anos, ele era um homem que havia construído impérios com algoritmos e vidro. Nascido no interior do Paraná, agora era um magnata internacional com escritórios em Hong Kong, Nova York e Londres.
Sua vida era imaculada — aço, mármore e silêncio. Seus apartamentos eram galerias de arte onde ele raramente dormia. Seu sucesso havia se tornado sua armadura, e a solidão, o preço que ele pagava voluntariamente por isso. Ele não via seus pais, Miguel e Maria, há quase seis anos. As ligações eram raras, curtas, e sempre terminavam com sua mãe dizendo: “Estamos bem, filho, não se preocupe”, mesmo quando o tom dela denunciava o contrário. Para aliviar a culpa crônica, ele fazia o que fazia de melhor: jogava dinheiro no problema.
Ele havia transferido duzentos mil dólares para seu primo, Kevin, com instruções simples: “Construa para eles a melhor casa da cidade. Moderna, segura. Garanta que eles tenham tudo o que precisam.” Naquela manhã, quando uma fusão gigantesca na Ásia fracassou no último minuto, Sebastião de repente se viu com quarenta e oito horas livres — uma anomalia em sua vida perfeitamente calculada. O fracasso, algo que ele raramente experimentava, deixou uma fresta em sua armadura.
Da janela do seu escritório no 30º andar, ele olhou para o horizonte de Curitiba e sentiu algo estranho e incômodo — nostalgia, embora tenha confundido com tédio. Ele queria ver a casa pela qual pagou. Queria ver a gratidão no rosto dos pais, queria a prova física de que seu dinheiro poderia, de fato, comprar a felicidade deles. Sem avisar ninguém, tomou uma decisão impulsiva. Sem motorista, sem assistente. Ele pegou sua Mercedes G-Wagon preta fosca, inseriu o endereço de sua cidade natal, Campo Largo, no GPS e começou a dirigir para o interior — em direção a um passado que ele pensava ter superado.
A rodovia logo se estreitou para estradas sinuosas e, em seguida, para caminhos de terra esburacados que o GPS lutava para reconhecer. O céu claro de Curitiba escureceu para um cinza pesado, e logo a chuva começou — uma tempestade do sul, um “temporal” feroz e interminável que transformava a paisagem em um borrão verde e marrom.
Enquanto a chuva batia no para-brisa, as memórias voltavam com força. Não as memórias felizes que as pessoas relembram com carinho, mas as sensoriais: o som da água pingando em baldes de alumínio, o cheiro de mofo impregnado nas paredes, o frio constante das roupas úmidas que nunca secavam direito no inverno. Ele havia prometido a si mesmo, aos quinze anos, que nunca mais sentiria aquele tipo de frio.
Ele sorriu com arrogância, limpando a condensação do vidro. Não mais, pensou. Seus pais provavelmente estavam assistindo à tempestade através de uma janela nova, com vidros duplos, em uma casa quente e seca, talvez com aquecimento no piso. Ele estava prestes a ver a prova de quão longe havia chegado.
Mas quando chegou a Campo Largo, tudo parecia menor, mais opaco, mais pobre do que ele se lembrava. A rua principal, antes arrumada, estava desgastada, as estradas esburacadas e alagadas. A chuva impiedosa parecia lavar o pouco de cor que restava. Ele virou na rua antiga onde crescera, esperando ver uma construção nova e brilhante se destacando entre as casas velhas.
Não havia casa nova. Apenas a mesma casa pequena, de madeira, com a pintura descascada, cedendo sob anos de abandono e o peso da tempestade.
E então ele os viu.
Seus pais estavam do lado de fora, na chuva torrencial. Não debaixo de um guarda-chuva, não por escolha. Eles estavam cercados por seus móveis encharcados — um sofá floral que agora era um borrão escuro, caixas de papelão desmoronando sob o peso de seu conteúdo, uma televisão antiga enrolada em uma lona plástica rasgada. Uma pequena imagem de porcelana de Nossa Senhora Aparecida, que sua mãe sempre guardou na estante, estava tombada na lama.
Eles estavam sendo despejados.
Sebastião parou o carro no meio da rua, o motor potente um zumbido baixo contra o rugido da chuva. Ele ficou congelado, em descrença. Sua mãe, pequena e frágil, tentava inutilmente cobrir um álbum de fotos com o próprio corpo. Seu pai, antes forte e orgulhoso, estava parado, olhando para a porta da frente trancada de sua casa enquanto dois homens, um deles um oficial de justiça, colavam um aviso de despejo nela.
Pela primeira vez em décadas, Sebastião se sentiu completamente impotente. Ele saiu do carro sem o casaco ou guarda-chuva, a chuva encharcando seu terno de dez mil reais instantaneamente, colando-o à pele.
“Pai! Mãe!” ele gritou, sua voz quebrando em meio à tempestade.
Eles se viraram — e a expressão em seus rostos não era de alívio. Era de profunda e agonizante vergonha. Sua mãe cobriu o rosto com as mãos, soluçando. Seu pai endireitou as costas, tentando preservar a última gota de dignidade que lhe restava, como se protegesse a esposa do filho que viam como um rei.
“Sebastião”, disse seu pai suavemente, a voz rouca. “O que você tá fazendo aqui? Você não deveria estar aqui, filho. Não é uma boa hora.”
“Não é uma boa hora?” A voz de Sebastião se elevou, tremendo com uma fúria que ele mal reconhecia. “O que está acontecendo aqui?” Ele se virou para os homens. “Quem são vocês? O que estão fazendo com a casa dos meus pais?”
O oficial de justiça, acostumado a confrontos, ergueu uma prancheta, impassível. “Estamos apenas fazendo nosso trabalho, senhor. A propriedade foi retomada pelo banco. Execução hipotecária por falta de pagamento. Hoje é o dia do despejo.”
“Hipoteca?” A voz de Sebastião falhou. Ele sentiu o sangue gelar. “Esta casa foi quitada há quarenta anos! Eu mesmo vi os papéis!” Ele se virou para o pai, desesperado. “Pai… e o dinheiro que eu mandei? Os duzentos mil dólares? A casa nova? Onde está o Kevin?”
À menção de seu primo, Maria começou a chorar mais forte, um som agudo que cortou a chuva. Miguel abaixou a cabeça, a água escorrendo de seus cabelos grisalhos. “Não há casa nova, Seb. E nem dinheiro. O Kevin… ele nos fez assinar uns papéis, disse que eram para as licenças da obra. Mas a construção nunca começou. Então vieram as cartas do banco. Ele disse que era só um empréstimo com garantia, uma formalidade… que ele ia consertar. A gente não queria te incomodar, filho. Você estava tão ocupado…”
O Confronto
Sebastião sentiu o peito apertar até doer. Seu primo — seu próprio sangue — havia pego o dinheiro destinado a cuidar de seus pais e, de alguma forma, o usou para garantir um empréstimo predatório contra a única casa deles, provavelmente falsificando assinaturas ou enganando-os. Sua arrogância, sua ausência, sua confiança em enviar dinheiro em vez de si mesmo… tudo isso havia permitido que aquilo acontecesse.
Naquele exato momento, como se o destino quisesse zombar dele, um Corsa velho e amassado parou atrás da Mercedes. Kevin saiu, sorrindo com presunção, provavelmente vindo para supervisionar o despejo, até ver quem estava parado na chuva.
A cor sumiu de seu rosto. Ele tentou recuar, voltar para o carro.
“Fica onde está, Kevin.” A voz de Sebastião não foi um grito, mas um comando baixo e frio como gelo.
Sebastião se aproximou, e pela primeira vez Kevin pareceu perceber a diferença entre o primo que lembrava e o homem que estava à sua frente.
“Sebastião! Que surpresa!” Kevin gaguejou, tentando forçar um sorriso. “Eu tava vindo resolver um… um probleminha no banco.”
“Você chama isso de ‘probleminha’?” Sebastião parou a centímetros dele. “Você vai para a prisão, Kevin”, disse ele baixinho, para que só o primo ouvisse. “Mas isso não será suficiente. Eu vou garantir que você passe cada dia do resto da sua vida pagando pelo que fez hoje. Vou te caçar legalmente até você não ter nem o nome.”
Ele se virou para os oficiais. “Quanto é a dívida? O valor total para quitar.”
Eles lhe disseram o montante. Para Sebastião, era um erro de arredondamento. Para seus pais, era o fim do mundo. Sem hesitar, ele pegou o telefone. A tela sensível ao toque mal respondeu aos seus dedos molhados. Ele ligou para seu gerente de banco pessoal em São Paulo.
“Ricardo. Preciso de uma transferência. Agora.” Ele ditou os números da conta e o valor. Do outro lado da linha, silêncio, depois um “Sim, Sr. Reis. Imediatamente, Sr. Reis.” Ele desligou e olhou para os homens. “O dinheiro estará na conta em menos de cinco minutos. Esta propriedade não pertence mais ao banco — é minha. Deixem suas ferramentas. Vão embora.”
Os oficiais, intimidados pelo homem encharcado que irradiava uma autoridade absoluta, recuaram. Kevin tentou escapar, mas Sebastião agarrou seu braço com força. “Você não vai a lugar nenhum até a polícia chegar.” Outra ligação — desta vez para o melhor advogado criminalista do país.
A chuva caiu mais forte, misturando-se com as lágrimas de raiva e vergonha que ele não se deu ao trabalho de esconder.
A Redenção
Quando o caos se acalmou, os carros da polícia e do banco se foram, levando Kevin algemado. A chuva começou a diminuir, transformando-se em uma garoa fina e fria. Apenas Sebastião e seus pais permaneceram na rua lamacenta, cercados por seus pertences encharcados. O silêncio era pesado, quebrado apenas pelo choro baixo de Maria.
Miguel olhou para o filho, sem saber o que dizer. “Você não precisava…”
“Eu precisava,” interrompeu Sebastião, a voz embargada. Ele finalmente olhou nos olhos do pai. “Me perdoem. Por não estar aqui. Por achar que dinheiro poderia me substituir. Eu falhei com vocês. Em tudo que importa, eu falhei.”
Sua mãe correu para ele, e ele a abraçou com força, enterrando o rosto em seu ombro. O homem poderoso que um dia governou arranha-céus agora era um filho quebrado agarrado à sua mãe na chuva. Miguel se juntou ao abraço, os três tremendo, não apenas de frio, mas pelo colapso de anos de distância.
Então Sebastião se afastou, olhando ao redor da velha vizinhança. Ele viu as outras casas, tão negligenciadas quanto a de seus pais. Viu os vizinhos idosos observando silenciosamente de suas janelas, rostos marcados pela preocupação. Ele não via mais apenas pobreza; via o resultado do abandono.
“Amanhã”, disse ele, a voz firme novamente, mas com um novo propósito, “a demolição começa. Mas não apenas desta casa.”
Seus pais olharam para ele, confusos.
“Vou comprar esta rua inteira”, ele continuou, olhando para Miguel e Maria. “Vou construir casas novas para cada casal de idosos aqui. Lares quentes, seguros e dignos. Com acessibilidade. Haverá uma clínica de saúde básica, um centro comunitário com refeitório… e vai se chamar Fundação Miguel e Maria Reis.”
Ele sorriu fracamente, enxugando a chuva do rosto da mãe. “E não vou mandar ninguém para supervisionar. Eu vou ficar. Vou administrar minha empresa daqui, de casa.”
O Novo Começo
Meses depois, a cidade antes esquecida estava viva novamente. O som que dominava a rua não era mais o do silêncio, mas o da construção. Onde havia lama e decadência, novas casas estavam surgindo — sustentáveis, bem iluminadas, cheias de vida.
Sebastião, agora trocando seus ternos por jeans e botas de trabalho na maior parte do dia, dirigia o projeto pessoalmente. Ele estava em uma mesa dobrável no meio da obra, tomando café coado em copo de requeijão com os mestres de obras, discutindo materiais. Sua empresa havia aberto uma nova sede regional na cidade, trazendo empregos e esperança para um lugar que o tempo havia esquecido.
Maria, com uma energia que não tinha há anos, organizava um mutirão para plantar uma horta comunitária no centro do novo complexo. Miguel, que Sebastião não via sorrindo de verdade desde a infância, estava orgulhosamente ensinando alguns dos trabalhadores mais jovens a ler as plantas arquitetônicas.
Kevin enfrentou a justiça, considerado culpado por fraude e estelionato, e Sebastião garantiu que ele não tivesse como escapar das consequências.
Uma tarde, Sebastião estava sentado na varanda da nova casa de seus pais — idêntica a todas as outras da rua — observando o pôr do sol. Sua mãe trouxe uma xícara de café para ele. Ele havia fechado um negócio bilionário pelo celular vinte minutos antes, mas a sensação de paz que sentiu ali, ouvindo a risada dos vizinhos, era algo que nenhuma quantia de riqueza jamais lhe dera.
Ele finalmente aprendeu que o dinheiro podia comprar casas, mas apenas o amor, o arrependimento e a presença poderiam construir um verdadeiro lar.